segunda-feira, 28 de julho de 2014

BUBBLE SHOOTER


Minha memória não retém os caminhos.
Me perco tão facilmente em lugares conhecidos que você já não distingue minha distração da minha estupidez.
Suponho que uma parte invisível do meu cérebro ficou amarrada em alguma árvore da Terra do Nunca, e sua parte material manifesta certos pensamentos infantis que surpreendem até a mim mesma.
Você me perguntou o endereço e eu só conseguia imaginar a estratégia para vencer a próxima sessão de bublle shooter. Imaginei meu canhão batendo na lateral da tela para ricochetear e acertar todas as bolhas que ameaçavam chegar ao limite e me levar ao game over.
- É por aqui mesmo?
- Oi?! Não faço ideia, meu bem.
- Mas você disse que foi até lá no mês passado.  
- Olha, eu não saberia chegar lá nem se voltasse no dia seguinte, quem dirá hoje. Liga o GPS. Eu sei o nome da rua.
- (...)
E você suspira fundo, como se fosse um suplício suportar (e conviver) com certas limitações que eu trago, com minha falta de organização e de visão tridimensional. Mal sabe você, que sempre que você vem desprovido de razão, com seu dedo em riste, eu penso no bubble shooter e faço centenas de pontos imaginários até você extravasar e achar que venceu.
Nessas horas, se você me colocasse nessas máquinas que olham tudo por dentro do corpo humano, veria que no lugar do coração eu possuo uma imensa bola colorida prestes a explodir diante dos seus olhos.

E esse ponto seria seu.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Um orgasmo poético

Foi o que tive após a apresentação de José Miguel Winisk aqui em Sete Lagoas ontem: 22/07/2014. 
O poema é do Gregório de Matos que o Winisk musicou e fez servir de trilha para o espetáculo Onqotô, do Grupo Corpo. Não quero mais intrometer minhas palavras aqui. Apenas observar o eco. Enlevada.

MORTAL LOUCURA (pra clicar!)

Na oração, que desaterra … a terra,
Quer Deus que a quem está o cuidado … dado,
Pregue que a vida é emprestado … estado,
Mistérios mil que desenterra … enterra
.
Quem não cuida de si, que é terra, … erra,
Que o alto Rei, por afamado … amado,
É quem lhe assiste ao desvelado … lado,
Da morte ao ar não desaferra, … aferra.

Quem do mundo a mortal loucura … cura,
A vontade de Deus sagrada … agrada
Firmar-lhe a vida em atadura … dura.

O voz zelosa, que dobrada … brada,
Já sei que a flor da formosura, … usura,
Será no fim dessa jornada … nada.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

*A fé ruge e o meu coração dilata


Não que essas sejam as melhores palavras...
Às vezes a excelência está na brecha de silencio.
Às vezes a poesia se compreende na pausa do verso.
Às vezes a gente entende a vida quando cansados, paramos para recobrar o fôlego.
O próximo passo da caminhada é ressignificado e nada mais será do mesmo jeito dali pra diante.
É aqui onde me encontro. Em agonia diante de uma silenciosa página em branco.
Ela é uma mão estendida, uma convocação.
Ela insinua (embora nem sempre ensine) que podemos criar as coisas, sermos pequenos deuses preenchendo as lacunas da tela do mundo com nossa própria tinta.
O silêncio é um manifesto pregado na porta que nos conduz para dentro ou nos remete para fora, como força centrífuga, supernova.
Em qualquer desses movimentos, as coisas não deixam de existir, por mais que as olvidemos.
O sol continua brilhando por mais que meu coração se confranja em tempestades, temendo as guerras, os líderes, o câncer e as falsas promessas de bonança.
O câncer parece uma palavra mal escrita que me afeta mesmo que eu saiba ou suponha sua razão.
Eu posso estar cheia de palavras e sons, mas quando vejo a ferida crescer em nós, tudo o que o pensamento publica no cosmos ao meu redor é um erro de digitação que o word não corrige automaticamente ou uma nota irremediavelmente dissonante.
Quando eu respiro, sei que há perfeita ordem, mas para uma pequena engrenagem há de haver uma reprogramação a ser feita, que nos impeça de ruir a máquina que integramos. A nossa ideia de ordem precisa de manutenção, de reajuste.
Um lenitivo que possibilite a permanência da sanidade.
Se uma verdade que eu não quero saber, simplesmente vem á tona, o que fazer para não ir á lona a nocaute outra vez?
Se a montanha aparece de repente no meio da paisagem, sem aviso prévio ou anestesia, preciso elevar a minha fé a nível de sayadin e remover outros apegos, gestos, restos e a velha necessidade de mais palavras. De pá, de lavra. De terra.
É preciso lavrar o solo da calma, da alma, esperar florescer aquelas sementes plantadas lá longe, com  a esperança que depositamos no amor. Os desatinos das lágrimas que ainda me restam, são rastros rebeldes da construção de um livro gravado a ferro e lava vulcânica através das eras que me compõem. 
Desvencilhar desse caminho, é quase que exigir do silêncio o fim do som. 
Eu ouço coisas que não quero acreditar e elas transitam pelo espaço à minha revelia.
Se eu pudesse converter a angústia em diamante agora, se em minha prece coubesse a fé, eu poderia, quem sabe (?), ter a riqueza suficiente para doar de mim a melhor frase! Aquela frase cheia de poder que lhe convenceria de que tudo vai ficar bem e que tudo aqui é efêmero, por mais que a dor neste instante seja aguda.
Mas (...) veja você, estou aqui rogando por mim mesma, porque no fim eu sei que essa lacuna que se estende diante dos meus olhos não é uma ruptura irreversível do mundo e mesmo assim eu dificilmente posso suportá-la.
São minhas placas tectônicas de medo procurando uma boa posição para que a superfície fique em paz.
Talvez seja um plano meu.
*
Estrelinhas para Teatro Mágico
"Se é na sutileza,
Que reside a exuberância.
Busco ressonância,
Nos ideais do amor."

terça-feira, 8 de julho de 2014

Fim de expediente

Notei todas as páginas em branco em sua agenda
Agora tudo o que você fez naqueles dias, jamais saberemos.
Meu sangue ficou coagulando enquanto eu decidia que destino tomar
Mal dá pra enxergar a espessura do corte.
Acho que às vezes minhas palavras são como uma folha A4 e se não manusear corretamente, pode cortar sua pele com uma lâmina de celulose e sangrar.
No meio da rua um silêncio de mar quando recolhe as ondas.
Você desconfia do porvir e procura ficar a salvo.
Preciso preencher uma planilha e todas as palavras do mundo resolveram orbitar ao redor dos meus olhos.
É uma distração que arde e paralisa no mesmo refrão.
Se nossos olhos se cruzarem, eu não vou precisar saber de nada.
Isso do sentimento emergir como um monstro da lagoa é a nossa lenda urbana particular.
Não haverá nenhuma frase insinuante, um esconderijo de intenções entre as palavras em meu texto.
Não.
Tudo é muito preciso, como o corte em minha mão.
Estou prendendo a respiração até parar de sentir a agonia da expectativa.
Porque há chances de tudo cicatrizar, mesmo que eu não feche o caixa do dia.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Tem que acontecer

Estivemos a fazer esses recortes
e a cola secou na ponta do bastão
O tempo chegou chutando a porta
enquanto eu dormia sem roupa.
No susto perdi o pudor e a coberta
Tudo ao redor era a alguma-feira.
Não sei se é assim contigo
de o caminho parecer desencaixado
e o nosso passo, por mais firme - parecer  trôpego
e a iminência do tombo te fizesse parar por instantes
recobrar o sentido da seta e da escolha
recobrar a memória e o fôlego
e adoçar o próximo café pelo menos uma colher a mais
O crepúsculo deixou o céu lilás
Isso enfeita o dia com uma poesia de troco
mais bonita que o troco do pão.
Por tudo o que a gente paga, é suficiente.
Mas o sol indo embora não colore os fatos
os gráficos, os índices e o cinza que o inverno imprime
quando falta uma peça e não há nada que me impeça de ser integral.
De que adianta? A cola acabou e eu não tranquei o quarto,
quebrei o relógio e o tempo continuou passando...
A gente ficou se olhando sem as palavras pra dizer.
Se eu perdi por negligencia o que foi fundamental,
agradeço a Deus pelo violão no canto
com todas as cordas e um canto que ainda não sei.
É só respirar e ir adiante.