terça-feira, 24 de maio de 2022

O frio que faz

 Existe essa dor que intensifica com a queda da temperatura.

Dói o dente, os ossos, as juntas e dói o coração.

O nervo se contrai e a saudade dilata.

Não deveríamos vagar na melancolia.

Estamos aqui. Sobrevivemos. Alegrai-vos! 

Mas silêncio...

Num piscar de olhos, a dor aparece.

E deixamos ali os dias de paz.

É...

É o frio que faz quando faz frio.

quarta-feira, 11 de maio de 2022

SAGITTARIUS A*

 No centro da Via Láctea existe uma fonte de rádio astronômica brilhante e muito compacta, perto da fronteira das constelações de Sagitário e Escorpião. Apesar de brilhante, é um buraco negro supermassivo.

Os astrônomos avisam que amanhã, 12 de maio, quinta-feira, às 10h, vai sair sua foto e há quem compare esse momento com a chegada do homem no solo lunar.

Eu aguardarei a foto. Aguardarei participar, talvez, de um momento histórico da humanidade que talvez ninguém se lembre, ninguém aguarde, ninguém se verá transformado, fora os astrofísicos, por uma foto, cuja complexidade, a ciência sabe, mas só sei de ouvir falar.

O que sei é que buracos negros são a distorção do espaço-tempo, esse tecido do universo, feito de 4 coordenadas espaciais. Acima/Abaixo, Direita/Esquerda, Frente/Trás e o Tempo. Quando essas coordenadas ficam extremamente distorcidas, de onde nem a luz escapa, há um buraco negro. O mistério, o profundo.

Pode ser que no universo existam micro-buracos negros distorcendo meu tempo, meu espaço, fazendo essa dissociação que chega na beira de me ensandecer. Dentro do meu cérebro, na fronteira das sinapses, supermassivos podem surtir efeitos ilógicos. Não vejo tudo enquadrado e nem tenho remoto controle, mas como uma segunda pele, um calo, uma casca, uma cápsula protetora, eu quero chegar antes, mas não dá. Estou numa esteira, eu corro, eu suo e permaneço cansada, querendo agradecer, mas tendo que correr sem sair do lugar, enquanto relógios me envelhecem sem perdão. Enquanto as estações mudam, as aves migram, surgem as rugas e nada muda de verdade no universo onde me prendi. Em outros universos, talvez eu seja a heroína captando a luz com uma câmera, enquanto o Sagitário A Estrela, longe de sugar a luz, permite-se ser revelado nos multiversos em que meu cavalo só falava inglês.

A foto é a antítese dos buracos negros. E pensando bem, os vampiros vieram de um deles. Eu vim pra te ver.