segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A perna adormecida

Num reino não muito distante daqui, onde os passarinhos assobiam o início de Patience
e as menininhas fazem coraçõezinhos no embaçado do Box,
vive uma não tão bela plebéia. Não, não, não...
Vamos mudar esse início:
Numa república federativa não muito distante da Bolívia ou da Argentina, ou do Paraguai,
onde os passarinhos assobiam Tico-Tico no Fubá e as menininhas fazem coraçõezinhos no embaçado do Box (resolvi deixar a parte do banheiro aqui!), vive uma razoável cidadã. Razoável? Que adjetivo é esse?!
Ela não tem madrasta má e não há bichinhos para o caçador arrancar o coração. Nesse lugar, a perversidade é camuflada, mas consegue-se ter uma harmonia apesar de tudo.
Certa perversidade existe nos padrões. Era uma república, era necessário estabelecer padrões para que os cidadãos soubessem por onde andar, o que fazer, onde fumar, onde trepar, essas coisas... E nós sabemos que quebrar padrões é se tornar diferente do resto ou de certa forma ser mais ou menos do que os outros que estão dentro do que se espera. É assim que surge o louco, o marginal, o gordo, o feio, o inadequado, as minorias.
Bom, mas essa razoável cidadã não queria saber nada dessa coisa antropofilosófica. Ela queria era caber naquela calça número 42. Estava sem entender porque a 40 não serviu, porque não passou nem nas coxas. A 42 não fechava o zíper direito, nem murchando a barriga. Comprou a 44 pensando que aquilo era absurdo. A calça número 44 nova tinha a cintura menor do que aquela velha que estava usando, número 40. “Poxa, deviam padronizar geral”. Lá na loja, enquanto ela dizia “Isso aqui não ta certo”, a vendedora respondia “É que depende da fôrma”. E ela em pensamentos “Que fôrma é essa que quer colocar todo mundo em forma de Barbie?”
Mas ela saiu da loja mais ou menos feliz com sua nova calça número 44. Fingiu que não ia se importar, mas chegou em casa com fome e comeu só maçãs. Agora estava numa dieta dessas por conta própria, à base de maçãs.
Finalmente chegou o dia em que a calça entrou confortavelmente. A nova calça número 44. Iria valer a pena, pois nos últimos dias ela vinha sonhando com frangos assados dançando Can Can sobre a mesa, espaguetes enroscando em seus braços, bombons fazendo passinhos de pagode... (A fome é má conselheira!!hehe).
De calça nova ela foi ao encontro do príncipe, aliás, do razoável cidadão. Ele demorou um pouquinho pra chegar no lugar marcado. Ela esperou se entretendo com um joguinho de celular
e nisso sentou sobre a perna e ficou lá. Calça skinny, perna dobrada, ele chegando...
Quando ele veio, ela se levantou depressa, mas a perna não acompanhou e foi inevitável o tombo. Não teve glamour nem cavalo branco, só a pequena tragédia. Ploft! "Ãin"
“Cê ta bem?
“Claro que não" pensou ela, "morrer é melhor”
Mas o que ela disse foi outra coisa: “ Tô sim. É que minha perna ficou dormente”.
Então ele veio com aquela mania que as pessoas têm de ficar esfregando a perna adormecida dos outros, até aquela caimbrinha passar. “Formigou?”, ele pergunta.
“Pára com isso, ta doendo”.
Mas ele insistia. Depois que passou o vexame e o formigamento, ela riu do próprio tombo, pensou em como aquela calça apertava a batata de sua perna e disse: "O filme vai começar daqui a pouco". Ele se desculpou pelo atraso e juntos foram felizes para o sempre que cabia entre aquele ponto e a sala de cinema.
Mas antes fizeram uma parada.
Hoje ela queria Milk Shake de Ovomaltine! De 500ml.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Com os lábios e com o coração

Estamos na ponta inicial do século XXI.
Não. Não há carros voadores, não há teletransporte ainda e mal chegamos na Lua.
O pequeno passo para o homem parece ser ainda o pequeno passo, apenas a expectativa do grande salto que a humanidade virá a fazer. Temos essas coisinhas cibernéticas, somos modernos, temos as facilidades eletrônicas, as tecnologias de ponta, todo o desenvolvimento científico e mesmo assim as coisas invisíveis ainda nos assombram, sejam fantasmas ou vírus.
Mas o que mais tem me assombrado é o encaixe imperfeito das teorias e das práticas. Como disse o Cazuza: Quando as idéias não correspondem aos fatos. Estou falando do ser humano intolerante com as diferenças e com os erros alheios. A música Gospel está em franca ascensão. São pastores, são fiéis, artistas convertidos lançando Cds. Em cada canto do país tem um padre cantando. Eu cheguei a achar que era muita mercantilização das coisas de Deus, mas hoje penso que se a mensagem toca a pessoa, se a mensagem transforma, então está valendo, embora muitas vezes o cantor chame mais atenção do que a música (!). No filme Stigmata, a mulher em transe diz: “O mensageiro não importa”. Era pra mensagem importar mais que o resto, mas enfim... Ouvimos louvores em diversos ritmos, em funk, em pagode, em forró, remixado. Até no carnaval tem axé carismático. O mundo não devia estar bem melhor? Se os caras vendem tanto CD, se os shows lotam, as pessoas não deviam estar inundadas de algo divino? Eu não estou falando de santidade. Falo das coisas simples como respeito, tolerância e amor. Coisas que o próprio Jesus fazia. Ele dizia que os sãos não precisam de médico. Era cercado por prostitutas, homens rústicos, cobradores de impostos (que não eram nada bem vistos na época) como o agora tão famoso Zaqueu! Ele dizia que atirasse a primeira pedra quem não tivesse pecado, e hoje o que vemos são “nobres fies” julgando e pior, condenando sumariamente o seu próximo.
Gente, quando Paulo era Saulo, matava pessoas inocentes, até que um dia se tornou Paulo, o apóstolo. Francisco de Assis, quando ainda era Giovani, aproveitava a vida como qualquer garoto da sua idade. Sidarta Gautama, era alienado dentro de seu palácio real.Só depois se tornou Buda. Tudo segue um curso devido na vida. Cada um tem seu momento de despertar. O respeito mútuo é dever de todo ser humano, porém, com aquele que repete as palavras do Cristo, ele é necessário, até porque “Muito será cobrado de quem muito recebeu”. Respeito às limitações, às fraquezas, às escolhas, ao modo de vida. Silêncio em relação às mazelas do próximo (Falo da fofoca.). Oferecer compreensão e auxílio quando a pessoa revela seu erro e não reagir com posturas radicais que condenam e segregam. Sim, porque quando aquele que sofre chega até nós, pode ser que ele esteja procurando a última estaca pra se sustentar. Se não lhe oferecemos isso, ele se afunda no erro e ali teremos também nossa parcela de culpa. De onde já se viu isso? Como se os padres, os pastores, os rabinos, os sacerdotes, os palestrantes não tivessem também um arsenal de erros... Como se fôssemos perfeitos!
Isso não significa amar o erro, mas amar o outro.
Este povo me louva com os lábios, mas seu coração está longe de mim... Frase de Jesus. Faz tempo que ele disse isso.
Faz tempo que repetimos as mesmas posturas.
Que nossos corações possam se aproximar mais do divino não só com louvores, com frases, mas também com exemplos, amando quem está do nosso lado, amando aquele que sinaliza um problema, amando sobre tudo, como atitude.
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Michele acha religiosidade mais importante que religião. Religar-se com o que é superior à nós qualquer ser humano consegue, seja ele ateu, a toa, beato ...
Mas a Michele (mesmo submersa em defeitos e fraquezas) acha que as idéias devem corresponder aos fatos. Se a pessoa prega o amor, ela deve ser capaz de amar. Com atitude.

sábado, 22 de agosto de 2009

All we need is love!!!

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"A arte deve ser o Belo expressando o Bem"
André Luiz
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Eram outros os planos para sábado à noite, mas a crise de tosse me fez ficar quietinha em casa, principalmente porque é dia de ventania.
Hoje ventou pra caramba e ainda venta madrugada adentro.
Ficando em casa, comecei a ver o Criança Esperança.
Nem pretendo agora entrar no mérito da solidariedade, da destinação das doações, ou algo do gênero. Só quero comentar como foi bonito o espetáculo.
Não sei como o “do” foi parar entre Trenzinho Caipira (ficou Trenzinho do Caipira) na apresentação do Luciano Huck, mas a abertura com Villa Lobos, executada pela Orquestra Sinfônica Brasileira de Jovens foi emocionante. O Didi, diferente de outros anos, não entrou com aquela jaqueta branca, mas vestido de maquinista do trenzinho.
Os atores da Globo estavam lá, circenses, mambembes, misturados junto a outros artistas menos conhecidos. Alguns tiveram números solos, mas grande parte deles estava ali anônima, o que foi bonito também. Milton Nascimento cantou “Maria Solidária” acompanhado de um coral de crianças. Foi muito bacana. Tudo foi bacana, música, figurino... Em seguida teve a Ana Carolina com o trecho musical que ficou “me ganhou, vai ter que me levar”! Ela é mulher de shows empolgantes, mas que não empolga platéia de Criança Esperança não! A empolgação fica por conta de Vitor e Leo (minha única rendição ao sertanejo, por tudo o que são!). Então, de repente eu ouço os acordes de “All we need is love”. E era a música toda, interpretada pelos rapazes do Fresno, Cídia e Dan e Júnior Lima de barba e tudo tocando bateria! Depois vem a Sandy cantando Chico Buarque. Justo a música da bailarina. Foi interessante ver a Sandy enfeitando a voz pra cantar palavras como “pereba”,”ameba”, “piolho”!!!. Nessa mesma apresentação, ainda houve um solo de ballet da Ana Flamengo, ops, aliás, Ana Botafogo! Teve uma moça que não conheço que se apresentou cantando “Gente” do Caetano com um arranjo bem legal. Ao fundo, aquela pintura da Tarcila do Amaral cheia de rosto de gente que tinha no meu livro de Geografia da 8º série (século passado!!): “Operários”. Nossa, teve Tim Rescala com pequenas apresentações de música e humor, teve uma apresentação incrível das acrobatas do Cique du Solei e outras várias apresentações que provaram que a Globo surpreende sim. Às vezes a gente espera algo embalado pra viagem e recebe uma viagem inteira cheia de paisagens bonitas.
E o sábado se vai abocanhado pelo domingo e junto com ele minha vontade de permanecer acordada!!

Sopro de Eves!!

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Vaca Sincera

Repouso meu olhar sobre o pasto onde pastam bovinos e penso:
Será que pastando eles pensam?
Ou será que o que eu penso que penso nem é pensamento?
A pasta com os documentos ficou para trás.
Por enquanto eu finjo que existo e pasto no mundo:
Imenso curral de absurdos onde pastam as vacas do meu pensamento.
A pasta de dentes há muito não tem validade,
por isso eu dou meu sorriso amarelo,
sorriso sem graça e quase sincero.
Alegria que pousa no pasto, alegria tão vasta (!) ...
Às vezes confundo alegria e vaca, mas uma saltita, a outra só pasta.
Uma vaca levanta a cabeça e me olha profundo.
Eu digo: Oh, vaca, eu não sou Raimundo e meu mundo é vasto,
o seu mundo é um pasto.
A vaca sorri e me fala:
Meu nome é Malhada e meu pasto é vasto,
o seu mundo é um pasto.
Abaixo a cabeça e me rendo. Concordo com a vaca, sem ressentimentos.
Eu vivo num pasto confuso, aposto que fui, não sei se já era...
Rumino a idéia que tenho da vida,
mas deixo na manga uma carta escondida
E um dia eu venço essa vaca sincera.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Conciliar - o poder que quero ter

Droga!
Habermas, Dworkin e Alexy estão aqui comigo.
Eu estou aí com você.
Günter, Kelsen e Foucault estão aqui comigo.
Mas eu continuo perto de você.
Estou rodeada desses alemães estranhos, do americano neurastênico e do francês careca e maluco, mas meu coração pulsa capixabamente.
Eu tento ficar aqui com esses caras, eu juro que tento, mas por algum motivo (qual será?!) você parece mais atraente. Muito mais atraente do que alguém que usa a palavra contumélia numa frase. Sério, isso não é nome de flor!!!
To aqui pensando, esses caras não deviam ter família ou vida afetiva, só pode. Nem os que ainda estão vivos. Se eles chegaram a constituir família, as esposas (ou sei lá, os maridos!) devem ter sido infelizes por serem sempre a segunda opção. Quem é que agüenta não ser prioridade? Alguém que foge ao “solipsismo metódico” (meu Deus, acho que já li isso em bula de remédio, embora o livro seja de filosofia jurídica!!) e repensa novas explicações axiológicas ou deontológicas de qualquer coisa, não deve ter tempo de fazer amor, olhar nos olhos do outro e não sentir culpa por não estar produzindo artigos acadêmicos ou inventando novos métodos de atormentar a vida de futuros acadêmicos.
"- Está bem querida, mas só 10 minutinhos. Tenho que me preparar para uma conferência muito importante. "
Rousseau mesmo, que escreveu Emílio, tratado de pedagogia, mandou seus cinco filhos para o orfanato.
James Barrie, que escreveu o Peter Pan teve seu casamento arruinado.
Bethoven ficou atormentado e sua amada imortal foi um mistério.
Eistein... Sei lá!
Dizem que Francisco de Assis e Clara canalizaram toda a sua energia sexual em prol das tarefas assistenciais.
Gandhi também foi outro que junto com a Kasturba, sua esposa, parece que teve que fazer igual o Francisco, embora tenha tido filhos.
O Luther King era mulherengo, apesar de pastor protestante e casado. É só ler a biografia dele. Maomé se casou por interesse. Jesus era solteiro. As coisas lá com a Madalena são especulações e se não forem, ela deve ter sido bem compreensiva por ter que acompanhar o salvador do planeta! Como é que concilia salvar a humanidade e ter um relacionamento amoroso? E as cobranças,e as expectativas, e a dedicação?! Tem que ser muuito evoluído, tem que entender a órbita dos astros, tem que ter um desprendimento fenomenal... Isso não é nada fácil. Por isso os padres são celibatários, para priorizar a missão. O problema é que alguns desequilibrados se tornam pedófilos. Os mais conscientes largam a batina, caso não consigam segurar a onda. Vai conciliar de outra forma a missão divina e o romance.
Marie Curie pode até ter sido feliz no casamento (mesmo com aquele cabelo sempre desgrenhado), mas o marido era físico como ela.
E olha, a gente vê poucas mulheres fazendo história , porque a maioria delas estava iluminando a humanidade cuidado da família. Cuidando de gente de uma forma mais direta, mais pessoal.
Você me pede prioridade e isso dá um revertério junto com os planos ambiciosos de excelência que quero ter no que faço, desse comprometimento que quero ter em minhas entregas.
Ninguém disse que seria fácil,mas eu bem que deixei você pensar que pudesse ser.
E olha a ironia: não está sendo fácil pra mim, porque se meu pensamento está aí com você, não posso ser inteira aqui com eles. É assim, eu desejo estar com você mais que com esses livros todos.
Enquanto isso na floresta, a tarde se vai junto com as questões inconciliáveis da humanidade, mas eu continuo aí com você.